quarta-feira, 15 de junho de 2016

CRÔNICA - Nossas vidas




"Porque aquele nosso velho papo de “também não me arrependo de nada” quase sempre é balela, coisa de senso comum. Só dizemos isso porque ainda não inventaram um fluído que nos proporcione a alteração das coisas do passado".

            Dia desses estava este humilde escriba concentrado em seus afazeres, entre telefonemas e aprovações, com o som da Rádio Alvorada ao fundo. Foi neste momento que começou a tocar, para minha alegria, a música “Minha Vida”, de autoria do meu xará Luiz Maurício, também conhecido pela alcunha de Lulu Santos. Devo confessar que adoro essa música. Lembrei-me de minha infância no bairro do Santo André, época em que eu também sonhava em ir tocar guitarra na TV. Essa música nos convida a uma reflexão sobre nossas vidas, nossos sonhos, comportamentos e realizações.

            Cada um de nós traz uma história diferente. E é bem verdade que desde novos realizamos alguns planos para nossas vidas, planos esses que nem sempre serão executados de acordo com nosso planejamento. Existem também aqueles que nada planejam e convivem com alguns acontecimentos jamais imaginados. É engraçado isso. Há pouco tempo, numa pequena reunião com um amigo aqui no Padre Eustáquio, falávamos sobre o assunto. Ele me dizia que tinha certeza de que não havia construído muita coisa em sua vida, mas se dava muito por satisfeito tendo tido um filho, por ter vivido bons momentos e, principalmente, por ter conquistado grandes amizades, o que ele considera como sendo o bem mais valioso que um ser humano pode ter. Fiquei pensando em suas palavras e tentando entender até que ponto concordo com ele.

            Todos nós temos nossos sonhos, ilusões e romances. Quando eu era menino, primeiramente quis ser jogador de futebol, o que é muito comum. Depois veio a paixão pela música, juntamente com a literatura, que carrego até hoje. A música não vingou, a literatura fez morada. Eu já era jornalista e nem sabia. Tempos depois veio o sonho de fazer a faculdade, sonho que também vim a realizar posteriormente. Não sei se no tempo certo, mas realizei. E, pra falar a verdade, nem sei se existe tempo certo para alguma coisa na vida. Acho que tudo o que acontece ou deixa de acontecer tem uma explicação. Demorei uma “eternidade” para amadurecer tudo isso na minha cabeça e hoje concordo que de nada adianta sofrer, chorar ou se lamentar pelo que aconteceu ou não deu certo, com pensamentos do tipo “Mas isso aconteceu para fulano que nem merece tanto quanto eu”.  Bobagem... Não sabemos o que “fulano” teve que passar ou fazer durante aquele período ou acontecimento.

Mas muitas das vezes agimos de forma impensada, em algumas por total falta de maturidade. Jogamos oportunidades para o ar, fazemos besteiras e demos nossas cabeçadas por aí. Situações normais na vida de qualquer pessoa, uma forma de crescer como ser humano e também como espírito, buscando uma vida melhor e mais próxima do que almejamos. É isso o que precisamos entender. Se o planejamento deu certo e você conseguiu tudo o que queria, ótimo. Se não, faça uma reflexão sobre o assunto e identifique por que não aconteceu, procurando corrigir todos os erros em busca do acerto. Se nada planejou, faça uma análise do que você ainda pretende para o resto de sua vida e execute o seu plano. Certamente ainda há tempo.

Acho que a opinião do meu amigo faz total sentido para nossas vidas e o pouco às vezes torna-se muito, mas de acordo com o propósito de cada um. Tenho convicção de que não trocaria minha vida “por um troco qualquer”, assim como no verso de “Minha Vida”. Mas hoje, mais maduro e com outra visão do mundo, eu faria muita coisa diferente sim. Porque aquele nosso velho papo de “também não me arrependo de nada” quase sempre é balela, coisa de senso comum. Só dizemos isso porque ainda não inventaram um fluído que nos proporcione a alteração das coisas do passado. E é isso aí. Vamos crescendo em cada dia. Não vou dizer somente para que façamos diferente. Eu vou sugerir que tentemos fazer de uma forma que nos proporcione real felicidade. 

terça-feira, 7 de junho de 2016

CRÔNICA - O taxista, a surpresa e o Senhor Luiz




“Eram tardes agradáveis e às  vezes eu “ajudava” o Sr. Luiz a tratar dos passarinhos, ora dando palpites, ora fazendo perguntas mirabolantes sobre as coisas. E ele, em sua vasta paciência, procurava me explicar tudo, quase sempre achando graça naquele meu papo de aranha.”


Na semana retrasada, retornando de mais uma agradável viagem ao Centro-Oeste mineiro, peguei um táxi na Via Expressa, na altura da Estação Gameleira. Para minha sorte, quem estava na ponta da fila naquele momento era o Sr. José, uma pessoa simpática e de coração muito puro, o que pude perceber rapidamente pelo amor demonstrado em suas poucas palavras. Lá pelo meio do pequeno trajeto, quando  iniciamos um papo um pouco mais efetivo, perguntei a ele se iria trabalhar até muito tarde naquele dia. Ele me respondeu: “Já estou parando. Vou embora curtir o meu netinho, que chegou hoje do Mato Grosso. Temos uma relação muito boa. Ele é muito apegado a mim, e eu a ele”. Fiz silêncio por alguns instantes para logo em seguida me dar conta de que, de alguma forma, já conhecia aquela história.

Muita gente já conhece a minha relação com o meu avô paterno, o Sr. Luiz Bento Machado, que também era meu padrinho de batismo. Desde muito novo eu já convivia diariamente com o Sr. Luiz, porque ele era meu vizinho lá na Rua Resplendor, no bairro Santo André. E era comum eu passar muitas tardes por lá, muitas vezes porque a minha mãe precisava me deixar com eles enquanto ia resolver questões profissionais no Centro de Belo Horizonte. Eram tardes agradáveis e às vezes eu “ajudava” o Sr. Luiz a tratar dos passarinhos, ora dando palpites, ora fazendo perguntas mirabolantes sobre as coisas. E ele, em sua vasta paciência, procurava me explicar tudo, quase sempre achando graça naquele meu papo de aranha. Ele sempre recordava de duas passagens: do dia em que eu levei uma caixinha de pasta de dentes para fazer o enterro de um passarinho, que tinha morrido, e do dia em que eu pedi a ele para xingar o insuportável vendedor de loterias, que ficava o dia todo gritando na Rua Pedro Lessa: “Olha a cobra, olha a cobra”.

Apesar da chatice deste vendedor, meu Xará Luiz costumava fazer algumas “fezinhas” no jogo do bicho. E ainda ganhava, sempre me enviando parte do prêmio para que eu pudesse comprar algo. Sempre foi assim. Quando eu tinha pouco mais de 05 anos ele me deu um canivetinho, que ele ganhou de um índio de Goiás, e prometeu que me entregaria o mesmo quando eu completasse 18 anos. E assim o fez.

Por todo o período em que estivemos juntos, sempre permaneceu, além da relação amorosa entre avô e neto, uma forte ligação entre duas pessoas, entre espíritos. O Sr. Luiz, além de meu avô e padrinho, também foi um grande amigo, confidente, vizinho, xará e companheiro de vida. Viveu, em sua vida simples, 95 anos de uma pureza ímpar. Os mesmos 95 anos que ele insistia em dizer que viveria, como lhe foi dito pela tal cigana, ainda em sua adolescência. E assim foi, até sua partida, ocorrida em 24 de julho de 2007.

Despertei de minhas lembranças para dar atenção ao Sr. José, o taxista, que naquele momento começava a me contar sobre uma surpresa que estaria organizando para o netinho (de 17 anos) naquela noite. Ouvi tudo com atenção e desejei muitas felicidades aos dois, reforçando a idéia de que conhecia muito bem a força daqueles sentimentos e de que era preciso valorizar e aproveitar enquanto era tempo.

Desci do carro com uma bela sensação de paz, enquanto o Voyage branco desaparecia na noite fria de Belo Horizonte, levando o Sr. José para a construção de mais uma dessas boas histórias que carregamos por nossas vidas. 

terça-feira, 31 de maio de 2016

CRÔNICA - Brigas, Obama e uma esperança.


Foto: Toshifumi Kitamura /AFP/JC

"É preciso entender que, guardando rancor, estaremos envenenando a nós mesmos, ocasionando mau humor, insônia, depressão e uma série de “pragas” que nos fazem morrer um pouco a cada dia. Isso mesmo! Morremos um pouco a cada dia graças a cada indiferença, rispidez, indireta, fofoca e desprezo."


Provavelmente já tenhamos passado, em alguma fase de nossas vidas, por brigas, desentendimentos e algumas decepções com pessoas de nosso convívio, sejam elas familiares, vizinhos ou companheiros de relacionamento. É, até então, normal e aceitável, considerando que temos opiniões e personalidades diferentes, graças a Deus.  Sendo assim, certamente já devemos ter experimento sentimentos de tristeza e raiva, ocasionando mágoa e um acúmulo de outras sensações devastadoras para a alma. Será uma resposta válida? Até que ponto deveremos conviver com isso? O ódio, a vingança e o desprezo irão resolver o acontecido, se é que aconteceu algo que realmente justifique tudo isso? Pensemos...

Já vi alguns casos de pessoas que pararam de conversar com amigos, irmãos e até mesmo com os pais. Certa vez alguém me disse: “Não sei lhe dizer, porque tem quatro anos que não converso com meu pai”. Coisa mais estranha! Eu nunca me imaginei brigado com meus pais, não dessa forma.  Essas “picuinhas” que vivemos atualmente vêm trazendo um grande desgaste para nossas vidas, uma vez que esses sentimentos tendem a corroer um pouco da energia a que carregamos, o amor que trazemos conosco e o que de melhor podemos oferecer ao mundo: O carinho e o respeito para com o ser humano, seja ele um familiar ou um simples transeunte, desses que encontramos em nossos dias e que muitas vezes fazemos questão de evitar.

Precisamos repensar nossas atitudes. Sei que somos seres humanos e vez ou outra temos essas sensações, mas se faz necessária a mudança. É preciso entender que, guardando rancor, estaremos envenenando a nós mesmos, ocasionando mau humor, insônia, depressão e uma série de “pragas” que nos fazem morrer um pouco a cada dia. Isso mesmo! Morremos um pouco a cada dia graças a cada indiferença, rispidez, indireta, fofoca e desprezo.

          No último sábado uma imagem me chamou a atenção. Lendo o jornal Estado de Minas, deparei-me com uma foto de Barack Obama, presidente dos EUA, depositando uma coroa de flores num memorial da paz na cidade japonesa de Hiroshima, que foi devastada em 06 de agosto de 1945 pela primeira bomba atômica da história, lançada pela aviação norte-americana. O que pensar disso? Só posso dizer que Obama foi muito feliz em sua atitude, demonstrando uma humildade ímpar, uma vez que ele jamais poderia imaginar como seria recebido. A prova perfeita de que é possível, sim, reconhecer e perdoar.

Atualmente as coisas acontecem numa rapidez incrível e é preciso aproveitar cada momento com felicidade, pois, não há como voltar em nosso passado. Tenho percebido muitas pessoas se afastando por motivos fúteis e considero uma tremenda ignorância, atitudes verdadeiramente imaturas. Já presenciei, em minha vida, vários casos de indivíduos que se viram forçados a pedir perdão num momento complicado, quando a pessoa a ser perdoada já se via praticamente com um pé fora do mundo em que vivemos. Situação difícil. É melhor deixarmos essas brigas e bobagens de lado antes que seja tarde. É melhor que sejamos felizes enquanto estamos aqui na terra, porque depois não há mais como perdoar, querer mudar, enfim.  


Devemos refletir sobre tudo isso e precisamos de certa frieza para largar esses sentimentos de raiva e orgulho em busca de uma vida melhor. Somos todos irmãos e já basta vivermos num mundo tão complicado, não necessitamos de mais discórdia, ainda mais por coisas tão insignificantes. Pensemos mais uma vez. Só que agora com maior cautela...

terça-feira, 24 de maio de 2016

Anos 80, a maternidade do Pop Rock Brasileiro




Quando Luiz Antônio lamentava a perda dos músicos e o fim da Fluminense FM, ele chamava a atenção para esse “Vodu” que havia se atirado sobre nós, retirando a vida daqueles que em muito colaboraram para o enriquecimento da música nacional dos anos 80.

O jornalista Luiz Antônio Mello publicou, há alguns anos, no Jornal do Brasil, uma crônica sobre os efeitos de uma possível “Maldição 80”, nome que intitulava o texto. Com visível pesar, O “xará” afirmava que a “geração 80” do rock brasileiro estava recebendo uma onda de tragédias envolvendo músicos e ícones. Maldição essa que, segundo ele, havia retirado de cena Renato Russo, Cazuza, Júlio Barroso (vocalista da Gang 90 e Absurdettes) e Marcelo Fromer, além da Rádio Fluminense FM, a Maldita, primeira a tocar as fitas demo de Lobão, Paralamas, Legião e Kid Abelha, dentre outros.

Para alguns economistas, a década de 80 foi considerada como perdida, devido à estagnação econômica vivida na América Latina. Em contrapartida, abrigou a criação e eternização do Pop Rock no nosso país, tendo revelado grandes nomes da nossa música e colaborando, também, com as manifestações sociais e políticas que compunham a época. Esses manifestos ficaram explícitos no trabalho de algumas bandas como, por exemplo, a Legião Urbana, o Capital Inicial e a Plebe Rude, que tiveram formação em Brasília e realizaram registros marcantes desses “Dias de Luta”. Para os amantes do gênero, as maiores bandas nasceram ali, em meio a tanta confusão política, manifestações, planos econômicos e outras coisas que preocupavam a população.

Certa vez defini os Anos 80 como sendo uma maternidade do Pop Rock brasileiro e, certamente, eu tinha razão. Não se pode falar deste assunto sem citar, também, a TNT, Os Replicantes, Picassos Falsos, Hojerizah, Zero, Camisa de Vênus, Barão Vermelho, Biquini Cavadão, Uns e Outros, Nenhum de Nós, Titãs, RPM, Paralamas do Sucesso, Heróis da Resistência, Dr. Silvana e Cia, Ira!, Blitz, Lobão e os Ronaldos, Cazuza, Kid Abelha e os Abóboras Selvagens e muitos outros que ajudaram a construir esse legado que o mantém vivo.

Quando Luiz Antônio lamentava a perda dos músicos e o fim da Fluminense FM, ele chamava a atenção para esse “Vodu” que havia se atirado sobre nós, retirando a vida daqueles que em muito colaboraram para o enriquecimento da música nacional dos anos 80. Muitos artistas se foram, algumas bandas chegaram ao fim e várias outras caíram no anonimato, sobrevivendo apenas em algumas rádios, mídias e festas dançantes.

Mas, como dito por ele, “a geração 80 não vai sucumbir à praga, pois, O pulso ainda pulsa”. Precisamos renovar, de um jeito ou de outro, todo o legado deixado por eles para que, assim, possamos garantir que as próximas gerações tenham acesso a todo esse “tesouro perdido”. Os anos 80 revelaram tudo o que é apreciado e cultuado até hoje, com letras históricas, contestadoras e marcantes. Verdadeiros hinos de uma geração que jamais será esquecida. A crônica escrita por Luiz Antônio continua fazendo muito efeito nesses tempos de “escassez” no Pop Rock Nacional e precisamos urgentemente de inovação e de melhorias.

Por outro lado, sinto-me feliz quando tenho a oportunidade de conhecer algumas bandas covers levantando a galera, quando interpretam músicas “sepultadas” há anos. Também tenho observado algumas bandas que fazem um bom trabalho autoral, muitas delas influenciadas pelo som eternizado na nossa querida “década perdida”. Portanto, devo concluir que ainda resta uma ponta de esperança e esperamos, ansiosamente, que a “maternidade” seja reativada. Pelo menos em parte.

Vida longa ao Pop Rock brasileiro!


quarta-feira, 7 de setembro de 2011

CARTAS DO SUL - PARTE I

CRÔNICA - LOUCOS POR TODA PARTE

DE CURITIBA – PR

"Satisfeito, ele continua caminhando pelo corredor e exaltando a grande invenção de Santos Dumont, entre algumas pessoas, que riam discretamente. Ele me chama mais uma vez e, querendo dar continuidade à conversa, tenta iniciar o "papo de doido" com uma pergunta estranha e direta: “Você sabia que Santos Dumont era viado”?

Nem mesmo os dias de descanso na capital paranaense são suficientes para me livrar de certas “personas estranhas”. É bem certo que, nesta semana, consegui finalmente escapar da terrível “Gangue” de engraçadinhos do Padre Eustáquio, liderada pelo “irreverente Edinho Mala”. Mas, para o meu espanto, descobri que elas me perseguem por toda parte, me “perturbando” em qualquer lugar, seja em Minas ou em qualquer outro destino em que me encontre. Acho que ando rezando pouco ultimamente...

Ainda no aeroporto de Confins fui surpreendido por uma figura exótica, no último sábado, no momento em que adentrava o Boeing 737-800 da Gol Linhas Aéreas com destino a São Paulo. Subia tranquilamente às escadas quando ouvi suas primeiras palavras, em conversa com uma mulher: “Quantas pessoas cabem num bichão desses? Umas quinhentas?” Fiquei ouvindo a conversa e a resposta da tal mulher, que disse não saber exatamente a capacidade. Foi nesse instante que ele bateu em meu ombro: “Ô garoto, (Fiquei feliz pela gentileza) você sabe quantas pessoas esse bichão leva”? Sem pensar emendei: Mais ou menos 160. Pois bem. Chegando na porta da aeronave a comissária nos saudou com um sorriso de bom dia e, mais uma vez, o figura faz sua incursão direta: “Ô minha filha, quantas pessoas esse bicho leva”? Ela gentilmente responde: “ Até 140 passageiros”. Satisfeito, ele continua caminhando pelo corredor e exaltando a grande invenção de Santos Dumont, entre algumas pessoas, que riam discretamente. Ele me chama mais uma vez e, querendo dar continuidade à conversa, tenta iniciar o "papo de doido" com uma pergunta estranha e direta: “Você sabia que Santos Dumont era viado”?

Eu sempre gostei de viajar. É bom conhecer um pouco da cultura das outras cidades e estados, você se diverte. Curtiba é uma cidade fascinante. Muito organizada e com bela arquitetura. Os bosques e parques são abundantes, assim como as araucárias. No último domingo aproveitei o belo dia de sol para realizar o passeio pelo “Tourism Line”, um ônibus tipo jardineira que circula pelos principais pontos turísticos da cidade. O ponto inicial é a Praça Tiradentes e o valor da passagem é de R$ 25,00, com direito a um embarque e mais quatro reembarques. Ele percorre os 24 pontos em aproximadamente duas horas e meia, passando pelo Jardim Botânico, Ópera de Arame e Rua 24 horas, dentre outros.

Na pequena fila de embarque observo um senhor simpático, acompanhado de outras duas senhoras, enquanto eu negociava com um guia turístico minha ida ao litoral do Paraná para o dia seguinte. Ele logo reconhece o sotaque e me pergunta se eu vinha de Minas Gerais. Nisso o senhor entra na conversa: “Você é de Belo Horizonte? Nós também somos de lá rapaz, moro no Eymard. Você conhece”? Respondo positivamente e ele continua: “Que mundo pequeno hein? Você sabe me dizer se o Galo ganhou ontem?” Após responder suas perguntas embarcamos no ônibus com destino aos pontos turísticos, já com o sol a castigar minha careca. Eu me esqueço de que já não posso mais abrir mão de um boné para esses passeios...

Lá em cima sento-me na poltrona do lado contrário ao conterrâneo. Ele continua: “Você já encontrou com o Padre Eustáquio lá no bairro?” Sim, todos os dias, respondi sorrindo e exibindo a pequena foto do Beato dentro da minha carteira. Ele fica quieto por uns instantes e logo começa a reclamar com as duas senhoras que o acompanham. Diz que está com fome, que já é hora de almoçar. Olho para o relógio para ver as horas: 10:15. Nesse momento, sobe no ônibus um casal com grande dificuldade, ela com o bebê no colo e o rapaz com várias bolsas e sacolas penduradas. Ele vinha caminhando pausadamente pelo corredor e o tio o segura pelo braço, interrompendo sua passagem. Imaginei que fosse oferecer algum tipo de ajuda, mas não era essa sua intenção: “Aqui... Pode ficar à vontade aí viu?” O rapaz não diz nada e, sem entender, caminha para o fundo do ônibus, com uma cara amarrada. O tio dá uma risadinha sarcástica e eu viro o rosto para o outro lado, a fim de rir também. Desembarquei um pouco adiante, no Jardim Botânico, desejando felicidade a todos eles. O tio finalizou: “Se encontrar com mais alguém de lá, (BH) diga que mandei lembranças”.

Nesses dois últimos dias em Curitiba peguei chuva, e uma temperatura oscilando entre 12 e 5 graus. Da varanda do Flat vejo a praça XIX de Dezembro lá embaixo, que é freqüentada por muitos jovens, emos, hippies e alguns grupos alternativos aos finais de semana. Duas outras figuras me chamaram a atenção: Um mendigo, já mais velho, desfilando imponente com um Blazer de lã e um outro andarilho, esse bem mais jovem, com uma touca e um sobretudo. Estava elegante o rapaz. Eu aqui a fim de comprar uma jaqueta de couro e eles lá, na maior onda. Mas fiquei Feliz por eles. Pensei: se o segundo tivesse me pedido algum trocado a resposta mais correta seria: “Troco pelo sobretudo”

É isso aí pessoal. Como disse no início da crônica as “Figurinhas” estão por toda parte. Não adianta fugir do Padre Eustáquio. Aproveito para mandar um abraço para todos os amigos de lá e reforçar o que o “tiozão doidão” do ônibus disse no passeio: “Sorrir ainda é o melhor remédio”.

Vou pra Porto alegre...

Tchau!


UM PEDAÇO DE MINAS NA CAPITAL PARANAENSE

Vou embora debaixo de chuva e pensando: “O Alto da Glória também é nosso”.

O Centro histórico de Curitiba é um paraíso para os apreciadores de uma bela cerveja gelada. São vários bares (casarões) em uma ladeira que em muito lembra a cidade de Ouro Preto. Eu me senti em casa. O local é tão sossegado que quase não se tem a sensação de que estamos no centro da capital. Saí na porta para um rápido cigarrinho e pude ver a placa com o nome da Rua: Mateus Leme. Nesse momento eu realmente me senti à vontade.

Outro fato a se destacar é a proximidade entre as torcidas organizadas do Coritiba Foot Ball Clube com as do Atlético Mineiro, e a familiaridade entre os dois times apesar da distância. Jovens desfilam tranquilamente com camisas do Atlético-MG pelas ruas ao redor do Couto Pereira, e bandeiras da Torcida Organizada Galoucura também fazem parte dos apetrechos utilizados pela maior torcida do Coxa, a Império Alvi-Verde. Camisas da torcida do Galo também são vendidas na loja da Império, assim como adesivos e outros acessórios. Lá dentro, brinco com o rapaz que me atende dizendo que a Galoucura estava presente, apontando para as camisas na vitrine. Ele responde de forma direta e com um sorriso: “Sempre!”. Vou embora debaixo de chuva, com uma camisa do Coxa nas mãos e pensando: “O Alto da Glória também é nosso”.

Viva o Galo, e também o Coxa!

domingo, 28 de dezembro de 2008

DEZ ANOS DE CARREIRA – 1999/2009

O ano de 2009 terá um sabor especial em minha vida, pois, estarei completando 10 anos de carreira literária. Na verdade eu comecei a rabiscar uns versos em 1992, voltei a rascunhar umas palavras em 1997 mas só amadureci a idéia de que me identificava com a poesia em 1999, ocasião em que alcancei o que chamo de “liberdade poética”, começando a mostrar meus trabalhos para outras pessoas. Os poemas tinham uma forma amorosa, mais artística e em formato de mensagem. Existia ainda uma sensilbilidade muito forte, uma coisa de criança sentimental, talvez fruto da tranquilidade emocional que eu apresentava naquela fase. Em comemoração ao aniversário destas práticas poéticas estou publicando aqui no blog alguns trabalhos da época, que compõem meu livro “Pegadas”, ainda não editado. Um grande abraço e muito obrigado.


Baby


Baby, eu ando triste.
A vida tá correndo, passando
Tão rapidamente.
E eu, nessa ansiedade.


Baby, eu tô que tô
E não estou nada.
Um pouco assim, indeciso
E não vejo nada, e nem ninguém
Ao meu lado.


Baby, eu preciso muito
Olhar as estrelas.
O mar,
As crianças.


Baby, eu ando perdido.
Assim: Uma pilha de desejos.
Um poeta triste,
Mas ainda
Apaixonado pela vida.


Baby, eu ando pensando.
A minha vida é nada
O meu coração se perdeu
E eu ando triste.


Baby, eu preciso é ser feliz.


Belo Horizonte, 22/12/2001


O Caminho


A vida corre, o coração sente
A necessidade da alma suplica.
O meu coração fraco
Sobre espinhos caminha.


Alguma coisa em mim palpita
A energia do sonho acalma
E sucintamente explica
O meu querer.


Vejo luz onde há trevas
Vejo o inexplicável onde há segredo
Com carinho te espero
Por onde houver desejo.


Em parceria com o amigo Thiago Leite Guimarães e sob alto efeito de Red Label.
Belo Horizonte, 16 de novembro de 2002.


ALGUMAS ROSAS


Às vezes sou tão louco

Que vejo com olhos iluminados

Pequenas pétalas de rosas

Que não têm nenhuma beleza especial.


Às vezes sou cego

A ponto de não enxergar

Nenhuma beleza ou brilho

Na mais bela das flores.


Acredito então, que talvez

As rosas simples e velhas

Talvez sejam bem mais belas

Do que muitas outras rosas.


BH, março de 1999


A ARTE DE VIVER


A vida é pura arte.

Para quem é artista o suficiente

Para fazer dela

Sua principal escultura.


BH, abril de 1999


NADA DEMAIS


Não sou nada demais.

Apenas não penso

Como outros mais pensam

Sobre a vida terrestre.


Não tenho a solução,

Para os problemas do mundo.

Mas me destaco, entre eles

Simplesmente por entendê-los.


BH, março de 1999


NESTA TERRA


Aqui nesta terra eu plano,

Uma pequena semente.

Cujos frutos irei colher

Em outras terras

Mais distantes

E bem mais férteis.


BH, março de 1999


EU SEM VOCÊ


Chama sem cor

Jardim sem flor

De um lindo e imenso castelo

Vazio e sem vida.

Numa linda noite de luar,

Sem estrelas.


BH, março de 1999


MOMENTO ÚNICO


A serra ao fundo.

De repente um amigo me vem.

Um belo bem-te-vi, canta.

A canção da esperança.

Faz uma parceria,

Com uma linda cachoeira.

E a natureza faz

O papel da regência

Como se comandasse

Esta linda orquestra

Esnsaiada

Por Deus.


Congonhas, dezembro de 1999


UM ROSTO ALEGRE


Um rosto alegre

Como um entardecer na praia.

Um sorriso

De luz

Encanta,

O mais triste

Dos mortais.


BH, março de 1999


CONTRASTE

Um dia somos estrelas,

A brilhar

Neste céu

Hoje escuro e vazio,

Como um deserto negro.

Outro dia somos estrelas,

Apagadas no céu morto.


TALVEZ NÃO MAIS EXISTAM


Talvez não mais existam
Árvores e suas folhas,
Lagos e seus lindos peixes,
Pessoas sem dificuldades,
Homens sem crueldade,

Talvez não mais existam
Entardeceres felizes,
Praças intactas e suas matrizes,
Crianças sensíveis,
Casais completamente felizes,

Talvez não mais existam
Homens fiéis,
Amizades,
Domingos felizes nos parques.

Talvez não mais existam
Amores verdadeiros,
Corações apaixonados.
Mais talvez existam ainda,
Alguns amores,
Nunca antes vistos.





quarta-feira, 22 de outubro de 2008

CRÔNICA - Escrita em Arraial do Cabo-RJ, 11/10/2008

CRÔNICA - DONA ADALGISA


 "Dona Adalgisa, uma cearense de 83 anos, conseguiu me envolver com a conversa bem antes do fim da descida da Serra. Antes mesmo do pedágio de Xerém eu já tinha conhecimento de um monte de coisas a seu respeito, e também da proximidade entre nossos pensamentos."


 Estou de férias. E, por isso, aproveitei alguns dias deste período para vir a Arraial do Cabo-RJ, que sem dúvida é uma das cidades do meu coração. Durante a tranquila viagem entre Belo Horizonte e Cabo Frio, pude pensar um pouco sobre a minha vida e descansar a mente. Ainda na Serra de Petrópolis uma presença me surpreendeu, fazendo com que eu retomasse o Pensamento sobre José Datrino, o Profeta “Gentileza”, cuja vida relatei em crônica recente. 

 Enquanto o ônibus deslizava pelas sinuantes curvas da Serra, uma senhora ao meu lado tentava com dificuldade abrir a um pacote de batatas. Já havia notado, desde o seu embarque em Juiz de Fora-MG, seu perfil cauteloso. Não encontrando êxito, acabou conseguindo abrir o pacote com uma tesoura que cuidadosamente retirou de sua bolsa. Mas aquele rosto me parecia familiar. Era bem vestida, com um ar protetor e uma fisionomia que realmente não me era estranha. Após pentear levemente os cabelos muito lisos, retirou de sua bolsa uma pequena bíblia, que guardou no suporte apropriado para objetos na parte de trás do assento a sua frente. 

 Bem, mas como eu dizia anteriormente, ela havia conseguido enfim abrir ao pacote. Jamais imaginei que ela pudesse vir a me oferecer batatas, devido à sua aparente seriedade. Cheguei a afirmar isso mentalmente, quando mais uma vez fui surpreendido pela minha mania de pensar e imaginar as coisas: “Está servido”? Ela me interrogou com sua voz doce e rouca. Eu nunca fui fã de batatas. E, mesmo que fosse, acho que ainda assim não aceitaria, por questões pessoais. Agradeci com grande sinceridade e continuei observando a beleza distribuída por Deus ao Parque da Serra dos Órgãos. Alguns quilômetros se passaram e ela fez uma nova tentativa: “Tenho também biscoitos doces”. Agradeci mais uma vez, seguindo a viagem. E realmente começaria, ali, a viagem. 

 Dona Adalgisa, uma cearense de 83 anos, conseguiu me envolver com a conversa bem antes do fim da descida da Serra. Antes mesmo do pedágio de Xerém eu já tinha conhecimento de um monte de coisas a seu respeito, e também da proximidade entre nossos pensamentos. Neste trecho, ela me contou um pouco de sua paixão por Cabo Frio (cidade em que reside há 24 anos). Aposentada, é formada em Serviço Social e Enfermagem. Trabalhou por muitos anos no Rio de Janeiro, tendo posteriormente fixado residência na Região dos Lagos. Teve três filhos, ficou viúva e hoje possui alguns netos. Adal, como é tratada por alguns familiares, ainda me deu um apanhado geral sobre a atuação política nas prefeituras de Cabo Frio e Arraial do Cabo. Mas se empolgou mesmo quando confessei, sem rodeios, que não aprovava o atual governo e que não havia votado no atual presidente em nenhuma das duas eleições. Nesse instante ela resumiu um pouco dos melhores trechos da administração política no Brasil. Uma verdadeira aula para um “garoto” que acabara de completar 30 anos de idade. 

 A interação entre nossos espíritos foi tão grande que conversamos sobre música (mais precisamente Chico Buarque, Rita Lee e Noel Rosa), literatura, saúde, poesia, economia, criminalidade, futebol e principalmente assuntos relacionados ao ser humano e suas relações com o mundo. Também tivemos tempo para falar sobre culinária, quando ela me ditou, muito rapidamente, a tradicional receita do Baião de Dois, um prato típico de sua região. Eu salivava de vontade enquanto nos víamos presos num pequeno engarrafamento em Magé-RJ. Foi quando me desconcentrei um pouco da conversa para uma rápida apreciação do Corcovado e Pão de Açúcar, ainda que de muito longe. Retomamos então a conversa, que confesso, foi muito proveitosa. Em nossa última parada, já em Rio Bonito, Dona Adalgisa se arriscou mais uma vez: “Tem certeza de que não quer mesmo um biscoitinho? Você pode comer mais tarde, na pousada, quando chegar”. Aceitei, considerando que aquela atitude era feita com uma pureza ímpar. 

 Apesar de ser evangélica, Dona Adalgisa citou, durante todo o período em que esteve ao meu lado, apenas um salmo da bíblia, com o intuito de exemplificar um de nossos assuntos. Fez questão de enfatizar que as pessoas são diferentes e que a pureza está no coração de cada uma delas. Passou-me o número do seu telefone e fez um convite para que fosse até a sua casa, garantindo que, caso lá aparecesse, poderia provar do tão falado Baião de dois, além de conhecer sua família querida. Infelizmente não pude dar um abraço de despedida em Dona Adalgisa, pois ela desapareceu na rodoviária de Cabo Frio assim que encontrou a filha, que ansiosa a esperava no setor de desembarque. 

 Desse rápido encontro ficou em mim a certeza do que vivo dizendo por todas as partes: que mesmo num mundo tão complicado, recheado de crueldades e violência, ainda podemos encontrar pessoas de puro coração. Disse que adora fazer amizades e me confessou com um sorriso no rosto: “Quando te vi aqui ao meu lado assim tão sério, pensei comigo mesma: Meu Deus, será que viajarei por seis horas calada ao lado deste rapaz”? O que Dona Adalgisa não sabia era que eu havia pensado praticamente o mesmo a seu respeito, devido ao seu perfil sistemático. Jamais vou me esquecer desta tarde, no qual aprendi coisas importantes com aquela senhora de ar bem familiar, devido a sua grande semelhança com outro amigo meu, o simpático e também cearense Sr. Abel. 

 Enquanto escrevo esta crônica, já no descanso e sossego da pousada, um grupo de pessoas aqui atrás está realizando uma saudação ao Caboclo Boiadeiro. Trata-se de um terreiro de umbanda que fica quase na areia da praia. Parecem felizes nesta noite de muitos ventos em Arraial do Cabo. Eu me sinto bem, e o barulho do mar me traz grande paz e energia. Neste instante me ocorre um nobre pensamento: As pessoas, quando querem, atraem coisas boas e praticam o bem, independentemente de sorte, humor, classe social ou religião. Tudo está reservado bem aqui dentro, do lado esquerdo do peito, e só cabe a nós despertar. Assim me garantiu Dona Adalgisa. 

 • Por Luiz Machado - Arraial do Cabo, 10 de outubro de 2008.